Sobre processos judiciais: “Sob o império da lei maometana, a autoridade pune até mesmo com a morte o homem que ela julga merecê-la, no próprio lugar e momento do flagrante; e essas súbitas execuções, às quais não faltam cegos admiradores, são, entretanto, uma das incontáveis provas do embrutecimento e da devida reprovação desses povos. Entie nós, a ordem é bem outra: é preciso que o culpado seja preso; que seja acusado; que se defenda; é preciso, sobretudo, que se volte para sua consciência e pense em seus negócios; é preciso preparativos materiais para seu suplício; é preciso, enfim, para dar conta de tudo, um certo tempo para conduzido ao local do castigo, que é determinado. O cadafalso é um altar: ele, portanto, só pode ser colocado ali ou deslocado pela autoridade; e esses atrasos, respeitáveis até em seus excessos, aos quais ilgualmente não faltam cegos detratores, não deixam de ser uma prova de nossa superioridade.” De Maistre, Les Soirées de Saint-Pétersbourg, Paris, Ed. Hatier, p. 78 (Décimo diálogo).
[J 65, 2]
Deus aparece em De Maistre como mysterium tremendum.
[J 65, 3]
[...]
Quem ensina melhor o que é realmente “o novo” é sem dúvida o flâneur. O que aplaca a sede do flâneur pelo “novo” é a aparência de uma multidão animada pelo seu próprio movimento e tendo sua própria alma. Na verdade, este coletivo não é senão aparência. Esta “multidão”, com a qual se deleita o flâneur, é o molde oco (Hohlform) que serviu setenta anos mais tarde para forjar “a comunidade do povo” (Volksgemeinschaft).52 O flâneur, que tanto se orgulhava de sua vivacidade de espírito e de seu não-conformismo, precedeu seus contemporâneos também no fato de ter sido a primeira vítima de uma ilusão que, a partir de então, ofuscou milhões depessoas.
[J 66, 1]
Baudelaire idealiza a experiência da mercadoria ao indicar-lhe como cânone a experiência da alegoria.
[J 66, 2]
Se é a fantasia que oferece as correspondances à recordação, é o pensamento que lhe consagra a alegoria. A recordação faz com que a fantasia e o pensamento se encontrem.
[J 66, 3]
Com os novos processos de fabricação, que dão ensejo a todo tipo de imitações, a aparência se consolida na mercadoria.
[J 66, 4]
Entre a teoria das correspondências naturais e a renúncia à natureza subsiste uma contradição. Ela se resolve quando, na recordação, as impressões se desligam da vivência, de maneira que a experiência vinculada a essas impressões se liberta e pode ser acrescida ao patrimônio alegórico.
[J 66, 5]
52 Referência ao vocabulário político do nacional-socialismo. (J.L.)BENJAMIN, Walter (1892-1940). Passagens / Das Passagen-Werk / Walter Benjamin; edição alemã de Rolf Tiedemann; organização da edição brasileira Willi Bolle; colaboração na organização da edição brasileira Olgária Chain Féres Matos; tradução do alemão Irene Aron; tradução do francês Cleonice Paes Barreto Mourão; revisão técnica Patrícia de Freitas Camargo; pósfácios Willie Bolle e Olgária Chain Féres Matos; introdução à edição alemã (1982) Rolf Tiedemann. — Belo Horizonte: Editora UFMG; São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2009.
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