• tacet: continua/benjamin/rua de mão única/infância berlinense: 1900

    30.7.24

    continua/benjamin/rua de mão única/infância berlinense: 1900

     
    “A meia
    (...)

    Tinha de abrir caminho até o seu canto mais escondido para encontrar o montinho das minhas meias, enroladas e viradas à maneira tradicional. Cada par parecia uma pequena bolsa. Nada me dava mais prazer do que enfiar a mão por elas adentro, o mais fundo possível. Não o fazia para lhes sentir o calor. O que me atraía para aquelas profundezas era antes o que eu trazia comigo, na mão que descia ao seu interior enrolado. Depois de a ter agarrado com a mão fechada e ter confirmado a minha posse daquela massa de lã macia, começava a segunda parte do jogo, que trazia consigo a revelação. Agora, tentava tirar para fora da bolsa de lã o que trazia comigo. Puxava, puxava, até que qualquer coisa de perturbador acontecia: eu tinha retirado o que trazia comigo, mas a bolsa onde isso estava já não existia. Nunca me cansei de pôr à prova esse exercício. Ele ensinou-me que a forma e o conteúdo, o invólucro e o que ele envolve, são uma e a mesma coisa. E levou-me a extrair da literatura a verdade com tanto cuidado quanto a mão da criança ia buscar a meia dentro da sua bolsa’.”

    BENJAMIN, Walter. Rua de mão únicaInfância berlinense: 1900 / Walter Benjamin; edição e tradução de João Barrento. Einbahnstraße; Berliner Kindheit um 1900. —1a ed; 4a reimp— Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2022. (Filô/Benjamin)

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