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J
[Baudelaire]
[...]
Nadar descreve o traje de Baudelaire, a quem encontra nas proximidades do Hotel Pimodan,
onde este morava: “Uma calça preta bem apertada sobre a bota de verniz, um blusão gola rulê azul de pregas novas bem esticadas; como único penteado seus longos cabelos negros,
naturalmente cacheados, a roupa branca de algodão brilhante, rigorosamente sem goma,
algumas penugens nascendo sob o nariz e no queixo, e luvas cor-de-rosa bem novas...
Assim vestido e não penteado, Baudelaire percorria seu bairro e a cidade com um andar aos
trancos, nervoso e lânguido ao mesmo tempo, como o de um gato, e escolhendo cada
paralelepípedo como se evitasse esmagar um ovo.” Cit. em Firmin Maillard, La Cité des
Intellectuels, Paris, 1905, p. 362.
[J 1a, 3]
Baudelaire foi — depois da viagem além-mar à qual o obrigaram3 — um homem que viajou
o mundo.
[J 1a, 4]
[...]
“A cúpula spleenática do céu”... Charles Baudelaire, Le Spleen de Paris, Paris, Éd. Simon, p.
8 <OC I, p. 283> (“Chacun sa chimère”).
[J 2a, 6]
“O catolicismo ... filosófico e literário de Baudelaire precisava de um lugar intermediário ...
onde se alojar entre Deus e o Diabo. O título Les Limbes (Os Limbos) marcava essa localização
geográfica dos poemas de Baudelaire; permitia perceber melhor a ordem que Baudelaire
quis estabelecer entre eles, que é a ordem de uma viagem e, precisamente, de uma quarta
viagem, uma quarta viagem depois das três viagens dantescas do Inferno, do Purgatório e do
Paraíso. O poeta de Florença continua no poeta de Paris.” Albert Thibaudet, Histoire de la
Littérature Française de 1789 à nos Jours, Paris, 1936, p. 325.
[J 3, 1]
Sobre o elemento alegórico. “Dickens ... falando dos cafés para onde se retirava nos dias
ruins ... comenta sobre um deles que se achava na Saint-Martins Lane: ‘Só me lembro de
uma coisa: que ele se situava perto de uma igreja e, na porta, havia um emblema oval de
vidro, com a palavra COFFEE ROOM voltada para os transeuntes. Ocorre me ainda hoje,
quando me encontro num café completamente diferente, mas onde há também essa inscrição
em espelho, que a leio ao inverso (MOOR EEFFOC), como o fazia muitas vezes em meus
devaneios sombrios, e o sangue me sobe à cabeça’. Esta palavra barroca MOOR EEFFOC é
o lema de todo verdadeiro realismo.” G. K. Chesterton, Dickens (Vies des Hommes Illustres,
n° 9), traduzido do inglês por Laurent e Martin-Dupont, Paris, 1927, p. 32.
[J 3, 2]
Dickens e a estenografia: “Ele conta como, depois de ter aprendido todo o alfabeto,
‘encontrou uma procissão de novos enigmas, os caracteres ditos convencionais, os mais
inimagináveis que jamais conheci. Não tinham a pretensão de significar; um deles, por
exemplo, que parecia um começo de teia de aranha, significava antecipação; e um outro,
espécie de foguete voador, desvantajoso’. Ele concluiu: ‘Era quase desesperador.’ Mas e de se
notar que um de seus colegas declarou: ‘Nunca houve um estenografia assim!’” G. K.
Chesterton, Dickens (Vies des Hommes Illustres, n° 9), traduzido do inglês por Laurent e
Martin-Dupont, Paris, 1927, pp. 40-41.
[j 3, 3]
Valéry, na “Introduction aux Fleurs du Mal” , Paris, 1926, p. XXV, fala de uma combinação
de “eternidade e intimidade” em Baudelaire.
[J 3, 4]
Extraído do artigo de Barbey d’Aurevilly in Articles Justificatifs pour Charles Baudelaire,
Auteur des Fleurs du Mal (Paris, 1857) — um opúsculo de 33 páginas, com contribuições
também de Dulamon, Asselineau e Thierry, publicado às expensas de Baudelaire em vista
do processo: “O poeta, terrível e terrificado, quis nos fazer respirar a abominação por esta
medonha corbelha que ele carrega, pálida canéfora, sobre sua cabeça eriçada de horror...
Seu talento ... é, ele mesmo, uma flor do mal vinda das estufas quentes de uma Decadência...
Com efeito, existe um Dante no autor das Fleurs du Mal, mas é o Dante de uma época
decaída, um Dante ateu e moderno, um Dante vindo depois de Voltaire.” Cit. em W. T.
Bandy, Baudelaire Judged by bis Contemporaries, Nova York, 1933, pp. 167-168.
[J 3a, 1]
Anotação de Gautier sobre Baudelaire em Les Poètes Français: Recueil des Chefs-d’Œuvres de
la Poésie Française, ed. org. por Eugène Crépet, Paris, 1862, vol. IV, Les Contemporains: “Nunca lemos as Fleurs du Mal ... sem pensar, involuntariamente, neste conto de Hawthorne
(“A filha de Rappucinni”)... Sua musa se parece com a filha do doutor a quem nenhum
veneno podia atingir, mas cuja pele, por sua palidez exangue, trai a influência do meio em
que vive.” Cit. em W. T. Bandy, Baudelaire Judged by bis Contemporaries, Nova York, p. 174.
[J 3a, 2]
Temas principais da estética de Poe segundo Valéry: filosofia da composição, teoria do
artificial, teoria da modernidade, teoria do excepcional e do estranho.
[J 3a, 3]
“O problema de Baudelaire podia, pois — devia, pois — colocar-se assim: ‘ser um grande
poeta, mas não ser nem Lamartine, nem Hugo, nem Musset’. Não digo que esse propósito
tenha sido consciente, mas estava necessariamente em Baudelaire — era até mesmo
essencialmente Baudelaire. Era sua razão de Estado. Nos domínios da criação, que são
também os domínios do orgulho, a necessidade de se distinguir é inseparável da própria
existência.” Paul Valéry, “Introduction aux Fleurs du Mal, Paris, 1928, p. X.
[J 3a, 4]
[...]
Baudelaire confessa “ter tido, enquanto criança, a felicidade ou infelicidade de ler somente
livros de adultos”. Charles Baudelaire, L’Art Romantique, Paris, p. 298 <OC II, p. 42>(“Les drames et les romans honnêtes”).
[J 4, 3]
[...]
Um motivo que se desgarrou do Spleen de Paris para a “École païenne”: “Por que, então,
os pobres não calçam luvas para mendigar? Eles fariam fortuna.” Charles Baudelaire,
L’Art Romantique, Paris, p. 309 <OC II, p. 49>.
[J 4, 5]
“Não está longe o tempo em que se compreenderá que toda literatura que se recuse a
caminhar fraternalmente com a ciência e a filosofia será uma literatura homicida e suicida.
Baudelaire, L’Art Romantique, Paris, p. 309 <OC II, p. 49> (Conclusão de “L’École païenne ).
[ J 4, 6]
[...]
Uma passagem do retrato de Victor Hugo na qual Baudelaire, como um gravurista numa
observação, desenhou a si mesmo, numa frase incidental. “Se ele pinta o mar, nenhuma
marinha igualará as suas. Os navios que sulcam a superfície ou que atravessam suas agitações
terão, mais que em qualquer outro pintor, este aspecto de lutadores apaixonados, este
caráter de vontade e de animalidade que se desprende tão misteriosamente de um aparelho
geométrico e mecânico de madeira, de ferro, de cordas e de tecido; animal monstruoso
criado pelo homem, ao qual o vento e a onda acrescentam a beleza do movimento. ” Baudelaire, L’Art Romantique, Paris, p. 321 <OC II, p. 135> (“Victor Hugo ).
3 A fim de afastar o jovem Baudelaire da vida desregrada que levava em Paris, seu padrasto, o general
Aupick, o enviou em junho de 1841 para uma viagem a Calcutá. Depois de ter passado cerca de dois
meses na Ilha de Réunion, Baudelaire regressou à França em fevereiro de 1842. (E/M)
BENJAMIN, Walter (1892-1940). Passagens / Das Passagen-Werk / Walter Benjamin; edição alemã de Rolf Tiedemann; organização da edição brasileira Willi Bolle; colaboração na organização da edição brasileira Olgária Chain Féres Matos; tradução do alemão Irene Aron; tradução do francês Cleonice Paes Barreto Mourão; revisão técnica Patrícia de Freitas Camargo; pósfácios Willie Bolle e Olgária Chain Féres Matos; introdução à edição alemã (1982) Rolf Tiedemann. — Belo Horizonte: Editora UFMG; São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2009.
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