Texto que recebi sobre a eleição
Queridos e queridas,
Escrevi essa mensagem pensando com carinho em cada uma das pessoas que eu amo que em algum momento me disseram que pretendem anular o voto neste domingo.
Hesitei, mas decidi escrever. Hesitei porque entendo que o voto é secreto e pessoal. Mas decidi escrever porque o voto é também coletivo e porque entendo que, neste momento da nossa história, não há espaço para silêncios. E eu queria compartilhar com você porque escolhi votar em Lula.
Neste domingo, há dois projetos de país em disputa. E um deles passa por uma destruição completa de tudo o que construímos como sociedade até aqui. O projeto que Bolsonaro representa para o Brasil é o que nos leva a um colapso como humanidade, de desrespeito ao outro, de enfraquecimento da democracia e de destruição do planeta. O que bolsonaro representa é inaceitável. Eu entendo a rejeição e as ressalvas ao Lula, também tenho as minhas. Mas votar em Lula neste dia 30 é votar também em Alckmin, em Tebet, em Henrique Meirelles, em João Amoedo, em Cristóvão Buarque, em Marina Silva, em Fernando Henrique Cardoso… essas pessoas tão diferentes e que tantas vezes foram adversárias não se uniram por acaso. Elas todas entenderam que o momento é grave demais para se omitir. Um eventual governo Lula agora será muito diferente do que os governos dele que já vivemos, porque ele estará sob intenso escrutínio e porque agora Lula representa uma frente ampla e diversa nas linhas de pensamento. Não será um governo petista, será um governo que vai reunir gente que pensa muito diferente. Entendendo e se comprometendo com um projeto de país que não seja de destruição e sim de construção, aderiram à candidatura de Lula figuras historicamente antipetistas. Até o autor do impeachment da Dilma, Miguel Reale Júnior, declarou seu voto no 13 por entender que esse é o único caminho para termos um país no futuro. Todas essas pessoas vão dar votos críticos. Talvez votem amanhã e, se Lula ganhar, já comecem a fazer oposição na segunda-feira. Porque é também por isso que eles declararam voto em Lula, para que tenham o direito de discordar pelos próximos quatro anos.
Quero compartilhar algumas das ameaças concretas que todo esse pessoal enxergou em mais quatro anos de governo Bolsonaro e que os motivou a votar em Lula amanhã. Aliás, não só eles, porque fora do Brasil as pessoas também estão de olho nesta eleição, de tão importante que ela é. Alguns dos principais jornais do mundo, além de comunidades científicas e acadêmicas internacionais, manifestaram opinião a favor do voto em Lula neste 30 de outubro. Não porque esses grupos adoram o petista ou têm algum tipo de preferência particular por ele, mas porque o projeto de Brasil que Bolsonaro representa é uma ameaça para nós, brasileiros e brasileiras, e para o resto do mundo.
- - Um dos pontos que estes observadores internacionais apontam como crucial é a preservação do meio ambiente. Não há chances para a Amazônia com mais quatro anos de Bolsonaro no poder. Isso não significa que em quatro anos a maior floresta tropical do mundo estará totalmente destruída, mas significa que chegaremos a um ponto de não-retorno, a um nível de desmatamento e destruição do qual não há mais volta e todo o planeta será impactado. É que está tudo interligado: a destruição da Amazônia afeta o sistema de chuvas em diferentes regiões. A derrubada de árvores lá afeta a emissão de gases de efeito estufa na atmosfera aqui, aí, no mundo. Destruir a Amazônia é colocar o planeta em risco. Quero te mostrar alguns dados, porque tem havido muita desinformação sobre este assunto. Bolsonaro mente nos números e isso tem deixado as pessoas em dúvida. Esses aqui não são dados do Lula, são dados que eu fui buscar para te mostrar um pouco do cenário da destruição do meio ambiente. Olha só:
*Desmatamento nos governos Lula: ele iniciou seu primeiro mandato com desmatamento em alta (21,6 mil km² em 2002). A partir de 2005, essa tendência de alta se inverteu. Em julho de 2006, última medição do primeiro mandato, Lula terminou com redução de 34% na área desmatada.
Após ser reeleito, de 2006 a 2010, o desmatamento caiu 51%. Neste meio tempo, o único aumento anual, de 10,8%, foi registrado entre agosto de 2007 a julho de 2008.
Considerando seus dois governos, a redução total foi de 67,6%. A área desmatada saiu de 21.651 km² em julho de 2002 para 7.000 km² em julho de 2010 — o último foi o menor índice durante a gestão do petista.
*Desmatamento no governo Bolsonaro: o atual presidente assumiu o mandato com os dados de julho de 2018 indicando um desmatamento anual de 7.536 km². Em agosto de 2019, considerando sete meses de gestão de Bolsonaro, o índice subiu 34,4%.
A partir daí, esse aumento desacelerou para 7,1% em julho de 2020; depois, entre agosto de 2020 e julho de 2021, cresceu 20%, quando, já eram desmatados 13.038 km² por ano.
Em quatro anos, Bolsonaro aumentou o desmatamento em 73% — dos 7,5 mil km² em 2018 para 13 mil km² em 2021. O último índice foi a maior taxa registrada pelo Inpe em 15 anos.
- - Mas não é só isso. Não há mais chance para a prosperidade e a valorização da educação com mais um mandato de Bolsonaro. Não há chance para as universidades. Não há chance para a cultura. Não há chance para os livros. Não há chance para a saúde pública, para o SUS. Quero trazer mais alguns números para que você não ache que essa é uma fala retórica, ou papo furado:
- só neste mês, Bolsonaro cortou R$2,4 bilhões das universidades;
- na saúde, os cortes passam de R$3 bilhões;
- 60% do programa Farmácia Popular foi cortado para repassar o dinheiro ao orçamento secreto;
- o dinheiro que hoje o governo federal repassa aos municípios para comprar merenda escolar é de 36 CENTAVOS por aluno (aqui em São Paulo, que é a realidade que eu apurei, isso tem resultado em um único ovo sendo dividido entre três crianças, por exemplo);
- a cultura é uma incógnita, porque o governo adiou os repasses para o setor cultural para 2023, mas não inclui esse repasse no orçamento - ou seja, não tem de onde sair, o setor não está contemplado nos investimentos;
Todos sabemos que o momento econômico é difícil e que não dá pra sair distribuindo dinheiro por aí. Mas há prioridades a serem estabelecidas e nenhuma dessas áreas está nas de Bolsonaro.
- - Com mais quatro anos de Bolsonaro, não há chance para que as mulheres se emancipem, saiam de relacionamentos violentos e sobrevivam com dignidade e autonomia. Não há chance para que mulheres e homens sejam tratados com igualdade.
- no orçamento de 2023, Bolsonaro cortou 99% da verba para programas voltados a proteger as mulheres e seus direitos;
- - Com mais quatro anos de Bolsonaro, não há chance para que construamos um Brasil de paz. Seu projeto de país inclui armar as pessoas e agredir os grupos que não são maioria de poder, além dos que ousam discordar. Isso é uma coisa importante, porque às vezes as pessoas acham que a violência só acontece quando ela é autorizada com todas as letras. Mas não. O exemplo vem de cima. E o exemplo que temos hoje é de um governante agressivo, violento e ofensivo para tantos grupos. Isso faz com que as pessoas se sintam autorizadas a fazer igual, a também xingarem, agredirem e ofenderem. Sabia que as denúncias de crimes de ódio na internet cresceram
67% no primeiro semestre deste ano? Eu, mulher, jornalista e ativista de direitos humanos, defensora do direito das mulheres, sou um alvo direto do governo e de seus apoiadores. Claro que a eleição não é sobre mim, mas te conto sobre a minha realidade, que é a que conheço bem. E ela inclui ameaças frequentes e uma vida de constante tensão, com medo de ser agredida ou violada. Fui atrás de mais um número pra você ver o tamanho do risco:
- o número de armas registradas no país triplicou no governo Bolsonaro. E o pior: as armas não ficam nas mãos de quem as registrou, elas estão indo também para as mãos de criminosos. Os dados da segurança pública mostram que o armamento do crime está mais potente e mais pesado. Em São Paulo, por exemplo, a apreensão de fuzis cresceu 50%;
- - Desculpe por ocupar este espaço de diálogo com um apelo que em outras circunstâncias eu não faria. Mas, como disse lá no início, acho realmente que nesta eleição não há espaço para silêncios. E por isso quis conversar com você. Não escolher também é fazer uma escolha. Na hora de votar, é só você e a urna. Seu voto é secreto e seu direito inalienável. Vote com amor, com esperança e com respeito. Bom voto!